sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Miguel Torga


Miguel Torga
Portugal
[1907-1995]


Frustração

Foi bonito
O meu sonho de amor.
Floriram em redor
Todos os campos em pousio.
Um sol de Abril brilhou em pleno estio,
Lavado e promissor.
Só que não houve frutos
Dessa primavera.
A vida disse que era
Tarde demais.
E que as paixões tardias
São ironias
Dos deuses desleais.

Miguel Torga, in 'Diário XV'



Quase um Poema de Amor

Há muito tempo já que não escrevo um poema
De amor.
E é o que eu sei fazer com mais delicadeza!
A nossa natureza
Lusitana
Tem essa humana
Graça
Feiticeira
De tornar de cristal
A mais sentimental
E baça
Bebedeira.


Mas ou seja que vou envelhecendo
E ninguém me deseje apaixonado,
Ou que a antiga paixão
Me mantenha calado
O coração
Num íntimo pudor,
— Há muito tempo já que não escrevo um poema
De amor.

Miguel Torga, in 'Diário V'



Hoje não são precisas palavras.
Miguel Torga tinha o condão de nos fazer entender o seu sentir.

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2 comentários:

  1. Lindo o poema de amor do Torga que, por acaso não conhecia.
    Simples, como ele sabia exprimir-se.
    Gostei e obgda. pela visita ao meu Jardim.

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  2. Não,
    um poema de amor não acontece por encomenda.
    Assim como o amor não se procura
    o poema não se descobre em algum sítio, escondido.
    Simplesmente acontece.
    Por capricho dos deuses ou dos acasos,
    (que talvez sejam a mesma coisa)
    o amor nem sempre aparece na Primavera.
    A vida, meu amor,
    é uma tômbola.
    Não é por nós rodarmos
    que roda a roda dela.

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